Sobre a lenda de Marquetalia
Mídia Sem Máscara
Eduardo Mackenzie | 08 Junho 2011
Notícias Faltantes - Comunismo
As FARC foram uma das criações típicas da URSS para levar sua Guerra Fria ao continente.
Quase todos os anos, em meados de maio, a imprensa de Bogotá repete de modo rotineiro os lapsos de sempre sobre Marquetalia: que foi ali onde "nasceram" as FARC, que ali "50 camponeses se levantaram contra o governo de Guillermo León Valencia", que ali foi "derrotado" o Exército, que ali surgiu a guerrilha "mais forte" da América Latina, etc. Esse mito fabricado pela propaganda da esquerda caviar tem a pele dura por uma razão: porque os historiadores e os jornalistas, que deveriam ser sérios e se sentir obrigados a investigar para poder contar o que ocorreu realmente ali, contentam-se em engolir inteiro as imposturas fabricadas por gente que sempre zombou da verdade.
Neste 28 de maio, com efeito, Jineth Bedoya Lima, célebre repórter de El Tiempo, fina conhecedora do tema das FARC e dos outros bandos ilegais do país, assinou uma boa reportagem sobre os esforços do Exército colombiano para retirar as minas anti-pessoa com as quais as FARC semearam a região de Marquetalia. Entretanto, nesse texto interessante e bem intencionado voltaram a aparecer os curiosos clichês já citados: que há 47 anos Marquetalia era "uma fazenda" e que ali "50 camponeses se levantaram contra o governo de Guillermo León Valencia".
A embrulhada foi rematada com o duvidoso "testemunho" de um "velho do povo" de Planadas, que deu à jornalista, sem mais nem menos e sem que esta se desse conta da manipulação, dois dados adicionais mentirosos. O "velho" afirma, por exemplo, que "em 29 de dezembro de 1964 começou a histórica operação Marquetalia" e que ali "o Exército perdeu a batalha e se engendraram (sic) as FARC". Falso. O Exército não perdeu ali nenhuma batalha. Tudo ao contrário: de 17 de maio a 15 de junho de 1964 (nada a ver com dezembro), o Exército desalojou, em brilhante ação, as hostes entrincheiradas de Isauro Yosa e "Tirofijo". Após os tropeços iniciais, devidos mais à geografia que a outra coisa, os militares ingressaram na zona fechada, puseram 35 guerrilheiros fora de combate, capturaram outros 54, libertaram a população do jugo terrorista e se apoderaram da documentação do grupo armado. Desde a primeira arrancada dos militares, o astuto "Tirofijo" fugiu com uma escolta de 48 guerrilheiros, para um enclave secreto na região de Guayabero. Os outros escaparam por um caminho para o enclave de Riochiquito, onde tratarão de fazer frente ao Exército sem nenhum êxito, pois serão desalojados dali em setembro do mesmo ano.
As FARC não "se engendraram" em Marquetalia. Essa organização, como estrutura militar com uma orientação ofensiva bem precisa, já existia nessa data, embora sem nome, e estava consolidando várias frentes em torno de um epicentro, sob o controle do Partido Comunista, o olho de Moscou na Colômbia. A proclamação da tenebrosa sigla não havia sido feita, como pensavam fazê-lo, pois o rápido assalto do Exército não lhes deu tempo.
As FARC foram uma das criações típicas da URSS para levar sua Guerra Fria ao continente. Em que pese isso, e ao apoio material de Cuba, essa guerrilha não foi uma das mais exitosas da América Latina, como alguns predicam, pois nunca conseguiram conquistar o poder (como certamente fizeram duas guerrilhas comunistas do continente). Nem sequer foram capazes de conquistar, de maneira durável, um só quilômetro do solo colombiano.
Planadas tampouco foi o lugar onde se formou a primeira guerrilha comunista colombiana. Esse lugar foi Viotá, epicentro da chamada "república independente do Tequendama", onde os vieiristas, com a ajuda de Vcitor J. Merchán, erigiram sua primeira escola de guerrilhas, nas barbas mesmas da autoridades, que não tinham claro que tipo de adversário tinham em frente.
Marquetalia não era uma "fazenda" com inocentes camponeses, como pretende a lenda. Era um altiplano, epicentro de uma ampla região chamada Gaitanía. O verdadeiro nome desse ponto era El Támaro. Quem inventou o apelativo de "Marquetalia" foi o guerrilheiro comunista Jacobo Prías Alape, cognome "Charro Negro", que em 1955 deu-lhe esse nome para prestar homenagem ao sindicalista Manuel Marulanda Vélez, o verdadeiro, não o que depois transformou esse nome em apodo para tratar de livrar-se do apelido de "Tirofijo". A etiqueta "Marquetalia" não tem nada a ver com a trajetória de Pedro Antonio Marín. Este, em janeiro de 1960, após a morte de "Charro Negro", adotou o nome de "Manuel Marulanda Vélez".
A região de Gaitanía tinha outro nome mas foi batizada assim por Fermín Charry Rincón, um ativista e guerrilheiro comunista. Em 1949 ele se apoderou dessa paragem de difícil acesso para criar a "república independente de Gaitanía". Esse lugar dispõe de corredores naturais para Caquetá e Cundinamarca, e limita-se com quatro estados (Huila, Tolima, Valle del Cauca e Cauca).
Por seu caráter estratégico, isolado e inóspito, essa região converteu-se em zona de retirada dos bandoleiros. Isauro Yosa, "Charro Negro" (o chefe de Tirofijo) e Ciro Trujillo, derrotados em outros estados, se esconderam e refugiaram-se ali, sobretudo desde 1959. Meses depois, esses bandos deram-se ao trabalho de reforçar suas instalações: cavaram túneis e trincheiras, e erigiram um bastião que pensavam seria inexpugnável, desde onde lançaram suas "comissões", quer dizer, suas bárbaras expedições contra os camponeses e os notáveis da região para colocá-los sob suas ordens. A esse lugar foram dar as hostes errantes de quatro conclaves armados: Planadas, Rionegro, La Herrera e Miraflores. Por isso, desde 1962 o Exército havia chegado à ampla região de Gaitanía para pacificá-la.
As primeiras repúblicas independentes, umas liberais e outras comunistas, apareceram durante o governo de Laureano Gómez e se estenderam desde então, até que Jules Dubois, um jornalista norte-americano, deu conta do fenômeno no Chicago Tribune, em 20 de novembro de 1961. Foi em razão disso que Álvaro Gómez Hurtado, dez dias mais tarde, expôs a questão ante o Senado colombiano. Nesse momento já havia onze "repúblicas independentes".
A tática dos comunistas nesses enclaves foi muito hábil: permitir a co-existência de grupos adversos para assimilá-los. Os camponeses liberais e conservadores poderiam receber proteção dos comunistas sob três condições: respeitar seus protetores, não fazer proselitismo e assistir, obviamente, a reuniões de doutrinamento a cargo de experts. Desse experimento saiu uma fauna política de novo tipo. Em certas zonas apareceu gente que se dizia "liberal-comunista", assim como "conservador-comunista", "católico-comunista" ou "protestante-comunista". O país esqueceu isso.
Isso explica, portanto, o aparecimento de uma aliança dos extremos (MRL, comunistas e até uma fração dissidente laureanista) que se opôs ao pacto da Frente Nacional de 1957, o qual abriu uma saída constitucional ao problema de quem seria o presidente da República em 1962. Para os coligados era impensável outra solução que não fosse de fato ou violenta. Porém, serão isolados e derrotados graças à popularidade da Frente Nacional e seu sistema de alternância e paridade política.
Tradução: Graça Salgueiro
Seja o primeiro a comentar
Postar um comentário