Por que ser neutro
Mídia Sem Máscara
Heitor De Paola | 27 Outubro 2010
Artigos - Eleições 2010
Heitor de Paola apresenta seu contraponto às posições do sociólogo Roberto DaMatta, que em artigo critica os eleitores que prentendem votar em branco, se abster ou anular seu voto.
N'O Globo de hoje DaMatta publicou op-ed denominado 'De que lado você está?' se referindo ao segundo turno da farsa eleitoral no próximo domingo. Depois de extensas considerações que a meu ver nada tem a ver com o assunto anunciado, mas sim com a velha e conhecida arrogância 'intelectual' brasileira que apresenta títulos e histórias pessoais para constranger o leitor, faz diversas perguntas que pretendo responder aqui. Comentei esta arrogância porque ela é tradicional dos povos de colonização ibérica onde os nomes extensos e a enunciação de títulos nobiliárquicos para esmagar o ouvinte foi substituída por títulos universitários usados com a mesma finalidade.
Ora, uma pessoa com tantos títulos deve saber mais do que o comum dos mortais. Ocorre que nas democracias a esmagadora maioria é feita de indivíduos da última estirpe que vota segundo a percepção de seus próprios interesses, inclusive no Tiririca ou por uma bolsa família, e não de 'iluminados' aos quais aqueles interesses não agradam.
Enumero as perguntas e minhas respostas, deixando claro mais uma vez que sou destes neutros apontados pelo autor, como já o fiz em vários artigos desde 14 de março último. Antes, no entanto, uma crítica ao autor: desde o início ele tenta intimidar as pessoas que não votam em nenhum candidato como se, por isto, fossem párias, uma hipocrisia tipicamente brasileira. Acostumados a ter no voto uma obrigação legal autoritária e não um direito que pode ou não ser exercido conforme suas conveniências, os eleitores brasileiros desenvolveram certa vergonha em dizer 'não vou votar' pois serão mais tarde acusados de não poderem criticar o que ocorre no país: 'Ah, você não votou, não tem direito de criticar!', idiotice que não se repete em nenhum país civilizado onde os direitos do cidadão incluem o de se abster.
(Chamo a atenção para o fato que mesmo o voto sendo obrigatório as abstenções, onde me incluo, somaram no primeiro turno 24.610.296, ou 18,12%. Os votos em branco 3.479.340 (3,13%) e os nulos 6.124.254 (5,51%), totalizando 34.213.890 num universo de 135.804.043 eleitores inscritos, portanto 26,76% contrariaram a opinião do Sr. DaMatta. Compare-se com os Estados Unidos, onde o voto é um direito e os abstencionistas respeitados como quaisquer outros: na última eleição, em 2008, o comparecimento foi recorde desde 1968: 63,0% ou 61,7%, conforme a estimativa de possíveis eleitores fosse de 208.323.000 ou 212.720.027. Portanto a abstenção foi de 37,0% ou 38,3%. Como lá não existe este absurdo registro eleitoral obrigatório, o número de eleitores é baseado em estimativa).
Perguntas e Respostas:
1. Você fica neutro quando um Presidente da República e um partido que se recusou a assinar a Constituição e foi contra o Plano Real usam de todos os recursos do Estado que não lhe pertencem para ganhar o jogo?
R - Esta tem que ser desdobrada em três partes:
(a) Eu também me recusaria a assinar esta excrescência que nos impingiram em 1988 como "constituição cidadã", embora por motivos exatamente opostos aos do PT: um papelucho que merece a lata de lixo por conceder direitos sem deveres, que aumentou a intervenção do Estado na economia e na vida íntima dos cidadãos, consagrou estatais e não eliminou a CLT a maior responsável pelo "custo Brasil", bloqueou a iniciativa privada e ainda teve dispositivos ridículos, como o limite dos juros em 12% e o que declara que "a saúde é um direito de todos e dever do Estado". Sem falar em ter propiciado penduricalhos altamente lesivos como o ECA e os PNDH (os três e não só o último!).
(b) Não fui neutro em relação ao plano Real e votei em FHC em 1994, mas reconheço o direito de um Partido marxista ter sido contra.
(c) Quanto ao uso de todos os recursos do Estado que não lhe pertencem para ganhar o jogo mostre-me quem não faz isto. Prove-me que não é o mesmo que fez FHC para aprovar a emenda da re-eleição em proveito próprio. Ou o Sarney para nos impingir os insanos planos cruzado e cruzado novo. Estes recursos existem por causa da indecente estatização que impera no Brasil e que nenhum dos candidatos pretende diminuir, pelo contrário, cada um quer se mostrar mais estatizante do que o outro. Privatização, mesmo a privataria tucana sem compromisso ideológico que manteve as empresas sob o jugo estatal, é, nos debates, motivo de acusação e ofensa. E pior: assim recebida!
2. Você diz que o jogo não interessa porque você queria que os adversários fossem do mais alto nível e isto não existe em nenhum país e muito menos no Brasil?
R - Não, Sr. DaMatta, eu queria apenas que entre os adversários existisse algum, mesmo no primeiro turno, que não fosse da esquerda da esquerda ou da direita que a esquerda adora! Minhas exigências não são tão grandes, votei em Collor em 1989, mesmo sabendo das acusações de corrupção em Alagoas, porque representava uma aspiração de liberalismo econômico contra um candidato assumidamente comunista.
3. Será que você não enxerga que o exemplo da neutralidade é fatal quando há uma óbvia ressurgência (sic) do velho autoritarismo personalista por meio do lulismo que diz ser a "opinião pública"?
R - Ao chamar de autoritarismo personalista o que vem ocorrendo no Brasil o Sr. demonstra que andou tão metido com metáforas carnavalescas, das quais nunca deveria ter saído, que esqueceu de estudar as idéias políticas que originaram a ascensão de Lula ao poder. Mostra desconhecer totalmente o Foro de São Paulo e a "retomada na América Latina do que foi perdido na Europa do Leste". Não há ressurgimento de coisa nenhuma, Lula é novidade na história política nacional, no máximo comparável às tentativas comunistas de tomar o poder em 35, 64 e 68, as duas últimas barradas em tempo pela pronta ação das Forças Armadas a pedido de organizações civis, que o Sr. mostra abominar no intróito do artigo. A afirmação de Lula de que "a opinião pública somos nós" é oriunda da mesma ideologia que criou o Pravda, o Isvestia, o Granma, a agência Tass e o Diário do Povo - ou, se preferir, o Völkisher Beobachter e o Il Popolo d'Italia -, e não de um personalismo varguista renascido. Como não conhece as raízes do PT, também desconhece as do PSDB no socialismo fabiano que só difere do marxismo-leninismo na velocidade e nos métodos empregados para atingir a mesma meta: a sociedade comunista ideal onde "todos serão iguais", métodos empregados nos oito anos de FHC. Além do que, o tucanato não é um partido nacional, mas representante dos interesses internacionais globalistas, como o Diálogo Interamericano, a Comissão Trilateral e as ONGS ligadas a George Soros. Não é coincidência que o tuxaua tucanalha defende a liberação das drogas por obediência aos grupos mais interessados nesta liberação, comandados por Soros, Peter Lewis e outros bilionários.
4. O que você esperava de uma disputa eleitoral no contexto do governo de um partido dito ideológico, mas marcado por escândalos, aloprados e nepotismo?
R - Aí você se engana também, Sr. DaMatta, e pelo mesmo motivo: falta de conhecimentos. O PT foi, é e sempre será um partido ideológico, assim como o PSDB. Os escândalos, aloprados e nepotismo fazem parte desta ideologia. O que possivelmente ocorre é que o Sr., como grande parte dos iluminados, acreditou que a ideologia petista era a da utopia de "um mundo melhor possível" para todos. Tão acostumado a pensar metaforicamente não lhe ocorreu que esta é uma metáfora do mundo melhor para eles, assim como foi na União Soviética e satélites, e ainda é em Cuba, na China e na Coréia do Norte. Em todos estes países o partido 'ideológico" e "utópico" enganou a todos pois seu objetivo era tão somente construir a Nova Classe para eles mesmos, o Partido Interno de Orwell.
Por outro lado, nada tenho contra os corruptos e sim contra as causas da corrupção e nestas ninguém quer mexer: exatamente o enorme poder econômico do Estado. Querem diminuir a corrupção (acabar não acabará, só num governo de anjos)? É fácil: desestatização total da economia, a começar pelas estatais sacrossantas, Petrobrás, Banco do Brasil, Caixa Econômica, BNDES! Mas a hipocrisia que reina neste país faz com que se acredite que a corrupção acabará a golpes de moralismo idiota, como a imbecilóide "lei da ficha limpa" deixando incólume o butim.
5. Você deixaria de tomar partido mesmo quando o magistrado supremo do Estado vira um mero cabo eleitoral de uma candidata por ele inventada? e 6. É válido ser neutro quando o presidente vira dono de uma facção, como disse com precisão habitual FHC?
R - (para 5 e 6) - Esta é mais uma, e das piores hipocrisias da política brasileira: a exigência - não Constitucional nem legal, diga-se logo - de que o Presidente seja um 'supremo magistrado do Estado' e não um homem comum, que pertence a um partido (uma facção) e que tudo fará para que esta vença as eleições. Obama, nesta última semana, viajou para cinco Estados e disparou sua linda esposa para outros tantos, exatamente fazendo campanha para os candidatos do Partido Democrata, principalmente para aqueles nos quais a cadeira do Senado está ocupada por importantes apoios às suas políticas e os Republicanos ameaçam tomá-las.
Obama, como ninguém por lá espera hipocritamente que o faça, não se traveste de 'supremo magistrado', mas mostra-se chefe de uma facção que defende uma determinada política e faz de tudo para que ela se mantenha. O exemplo britânico então é cabal: o Primeiro Ministro durante todo o exercício do cargo atua no Parlamento como chefe da facção por ele liderada. Sarkosy não fica olimpicamente no Élysées, mas vai à luta fazer campanha pelos candidatos do seu partido. O tal "Poder Moderador" já acabou há mais de 100 anos e nem consta mais da Constituição.
7. Se o time do governo deve sempre vencer porque tem certeza absoluta de que faz o melhor, pra que eleição?
R - Esta é tão ingênua que me envergonho de responder: pra que se pergunte se o povo concorda que o time do governo está fazendo o melhor.
Para finalizar, digo ao Sr. DaMatta que sou político por natureza, acompanho eleições desde 1950, às vezes com gosto, outras com enfado, muitas com raiva, como a atual. Não considero 'que tudo é péssimo', só os atuais candidatos. Não 'enverdeço nem escondo o meu medo de decidir com argumentos bacharelescos' como os seus. Digo de que lado estou: do conservadorismo na moral e nos costumes, da condenação absoluta ao aborto, à grotesca união de gays e à liberação das drogas. Da liberdade no sentido anglo-saxônico do termo na política e do liberalismo clássico na economia. Nem 'acredito em deuses ou super-heróis', como não foram Ronald Reagan nem Margareth Thatcher, nem Alberdi ou os Founding Fathers.
E é por tudo isto que me abstive no primeiro turno e, se lá comparecer, votarei em branco no segundo. E sei que falo em nome de milhões de eleitores.
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