Entre whisky e whisky
Mídia Sem Máscara
| 14 Janeiro 2011
Internacional - América Latina
Entre um gole e outro, Juan Manuel Santos calma e descaradamente confessa: sua agenda política é de esquerda.
No último fim de semana foi publicado neste periódico uma interessante reportagem que a ex-candidata vice-presidencial do Polo Democrático, Patricia Lara, fez com Juan Manuel Santos durante a viagem que ele realizou à Brasília para celebrar o ano novo e, ao mesmo tempo, assistir a posse de Dilma Rousseff. Trata-se da mais importante entrevista com o Presidente, desde o dia de sua posse. E embora tenha tratado de ser algo ameno, entre whisky e whisky, salmões, bons vinhos, filmes de ação, biografias de grandes traidores e elegantíssimos bailes ao melhor estilo Pastrana, a jornalista conseguiu alguns elementos que põem de manifesto as características da personalidade do mandatário.
Não é desconhecido de ninguém sua inclinação para o jogo. Os que durante a campanha o criticavam com sevícia e hoje o aplaudem delirantemente, miseravelmente o catalogavam de ludópata e jogador profissional trapaceiro. Os apostadores desenvolvem uma misteriosa habilidade para conhecer a psicologia de seus rivais. Descobrem suas debilidades e temores, para dar uma patada no momento indicado.
É interessante quando a cronista nos recorda que Santos, desde sua coluna em "El Tiempo", converteu-se em um firme opositor do regime contaminado de Ernesto Samper. Porém, há alguns que acreditam fervorosamente no dinamismo da política. Aquele que ontem era meu inimigo, hoje é meu aliado. Essa doutrina permitiu que o brilhante farol do atual governo seja o ex-presidente Samper.
Conta Juan Manuel Santos que, "por disciplina liberal" (esquerdista), não acompanhou Álvaro Uribe em sua candidatura de 2002. Esqueceu-se de lembrar aos leitores que também o criticou e se opôs a muitas de suas políticas até o dia em que resolveu dar - digamos com crueza - a cambalhota. Em 2006, passou de ser um esquerdista disciplinado e obediente a furibundo uribista, promotor da re-eleição como única alternativa viável para a estabilidade do nosso país. Não é novidade para ninguém que os convertidos tendem a se mostrar dignos de sua nova religião com atitudes que podem beirar o fanatismo.
A disciplina foi dar ao traste no ano passado quando anunciou sua candidatura presidencial, aspiração que resolveu tramitar no seio do Partido da U e não no do seu amado e respeitado esquerdismo. Já dissemos: há físicos extraviados nos despenhadeiros da política com demasiada capacidade para escrever um tratado sobre o dinamismo.
Em 29 de outubro de 2008, 27 oficiais e sub-oficiais do Exército, inclusive três generais, foram retirados do serviço, acusados de ser os "responsáveis" pelos denominados "falsos positivos". Essa decisão, que minou para sempre a moral dos soldados, não estava respaldada por uma investigação, senão por um informe vago e temerário que foi elaborado por uma equipe liderada pelo tenebroso general conhecido com o apelido de "La Machaca".
Passaram-se mais de dois anos desde o dia em que aqueles membros do Exército foram expulsos como se se tratassem dos piores criminosos, sem que até o momento se lhes tenha imputado o cometimento de delito ou falta disciplinar alguma. Sua honestidade não pôde ser questionada pelas autoridades. Porém, Juan Manuel Santos sente orgulho dessa gigantesca iniqüidade que se consumou enquanto ele desempenhava a função de ministro da Defesa do presidente Uribe.
A esse respeito, e sem pensar duas vezes, ele disse a Patricia Lara que "tinha que relevar todos os possíveis envolvidos de maneira exemplar". Lamentavelmente, essa retirada do serviço ativo violou o mais fundamental dos direitos de qualquer cidadão: a presunção de sua inocência. Antes de terminar, o presidente reconheceu o que habilidosamente soube esconder enquanto buscava os 9 milhões de votos uribistas: que sua agenda política é de esquerda. Diria um melancólico: se eu tivesse sabido...
* Colunista do jornal El Espectador de Bogotá
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