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domingo, 6 de dezembro de 2009

Mídia Sem Máscara Lucas Mafaldo | 05 Dezembro 2009 Artigos - Economia Desde os bancos escolares, os alunos aprendem duas coisas: que precisam se pre

Mídia Sem Máscara

Lucas Mafaldo | 05 Dezembro 2009
Artigos - Economia

Desde os bancos escolares, os alunos aprendem duas coisas: que precisam se preparar para disputar uma das escassas vagas no vestibular e que o capitalismo gera uma competição desumana. O que eles não aprendem é que a escassez de vagas no vestibular é fruto da alta regulamentação estatal que pesa sobre o setor - algo muito distante do capitalismo laissez-faire.

Creio que uma das principais razões que levam os brasileiros a rejeitar o discurso liberal é confundir a realidade burocrática em que vivem com uma sociedade autenticamente fundada em uma ordem livre. Os formadores de opinião, afinal, atribuem a quase totalidade dos males contemporâneos ao capitalismo sem avisar ao público que o país em que vivem está muito longe de ser um exemplo de economia aberta.

A questão da competição é um exemplo desse problema. Como Pedro Sette Câmara explicou muito bem, os brasileiros vivem em um clima de extrema competitividade, que é prejudicial a todos e não tem relação alguma com o liberalismo. Por isso, acredito que é importante enfatizar que a própria noção de competição adquire um caráter distinto em uma sociedade aberta e em uma sociedade burocrática.

Antes de mais nada, é preciso lembrar que livre-mercado não é necessariamente sinônimo de competição. Os liberais não afirmam que a competição é necessária, mas sim, que ela deve ser permitida. Há uma grande diferença: no primeiro caso, só seria considerada liberal uma economia que disponibilizasse ao menos duas alternativas para cada serviço e produto. Ora, isso não é nem possível nem desejável. Se apenas uma pessoa está disposta a prestar determinado serviço, isso não caracteriza um monopólio; esta é apenas uma situação comum de mercado, onde um único produtor está satisfazendo o consumidor a um custo baixo o suficiente para que outras pessoas não queiram competir com ele. Não cabe ao governo, portanto, nem criar artificialmente uma situação de competição, nem impedir que ela surja naturalmente. Cabe aos produtores e consumidores decidirem quais arranjos econômicos são desejáveis para todos.

Além disso, a competição não é criada por nenhum sistema econômico; ela é uma consequência direta da escassez. Posto que os bens materiais e as posições sociais são finitos, e que uma distribuição perfeita destes é impossível (para não dizer indesejável), haverá sempre alguma competição. Os diferentes sistemas estabelecem apenas o modo como essa competição será realizada.

É nesse ponto que encontramos a diferença abissal entre a competição no livre-mercado e a competição na burocracia. No livre-mercado, a competição tem como objetivo agradar o consumidor. Portanto, vence aquele que entregar o melhor produtor ao melhor preço, ou seja, aquele conseguir ser mais eficiente na sua área. Isso funciona fundamentalmente entre as empresas, mas os gerentes inteligentes saberão também internalizar esse processo, promovendo os funcionários mais eficientes para os propósitos da organização.

Os órgãos burocráticos, por outro lado, não possuem clientes, mas sim, usuários; ou seja, as pessoas que usufruem dos serviços desses órgãos não pagam por eles. Por isso, enquanto o cliente de uma empresa pode exercer influência direta sobre essa organização por meio da ameaça de levar seu dinheiro para um concorrente, os órgãos burocráticos só podem ser influenciados indiretamente por meio de reinvindicações políticas. Os políticos decidem as regras que regem essas organizações e, em muitos casos, também indicam aqueles que assumem cargos de coordenação. Salários, promoções, novos projetos - tudo isso é decidido no âmbito político. Isso significa que, na prática, é a classe política, e não o povo, que estabelece as regras da competição burocrática.

Por isso mesmo, um dos efeitos da competição burocrática é fazer com que as pessoas desviem seus esforços do objetivo de aprimorar seu trabalho para o objetivo de aumentar seu poder político. Consequentemente, a qualidade do serviço cai e os "usuários" são prejudicados. Enquanto isso, a militância partidária se torna uma atividade fundamental, o que é amplamente aproveitado pelos políticos interessados em aumentar seu próprio poder sobre a sociedade.

Há outra diferença importantíssima: ao contrário da competição no mercado, a competição burocrática é sempre um jogo de soma zero. Isto é, a competição dentro da burocracia admite sempre apenas um vencedor; só é possível sair ganhando quando outra pessoa sai perdendo. Vejam o caso dos concursos públicos: se existem vinte pessoas disputando uma vaga. Por mais que as vinte se esforcem, no fim resta apenas a mesma única vaga. O esforço dos demais candidatos foi em vão, e apenas os primeiros colocados são recompensados.

No livre-mercado, a situação é inteiramente diferente, pois todas as empresas estão gerando valor. Por isso mesmo, dezenas de padarias podem coexistir em uma mesma cidade: cada qual atende um tipo diferente de demanda, seja por uma diferença no preço, na qualidade, na localização, ou mesmo no estilo do produto oferecido. Em outras palavras: no livre-mercado não é necessário derrubar alguém para subir; basta descobrir um demanda que não está satisfeita e buscar satisfazê-la de modo eficiente.

Por isso, a competição no livre-mercado não apenas admite vários vencedores, como também favorece o surgimento de iniciativas para atender as mais diferentes parcelas da população. Ao invés de gastar seus esforços em campanhas políticas e brigas partidárias, as pessoas investem suas energias em atividades produtivas que irão enriquecer toda a sociedade - e não apenas a pequena elite que conseguiu subir ao topo da estrutura estatal.

Quando nos voltamos para o caso brasileiro com isso em mente, somos forçados a concluir que muitos dos elementos negativos em nossa cultura tem origem no fato de que nossa sociedade gira em torno de uma extensa estrutura burocrática. Desde os bancos escolares, os alunos aprendem duas coisas: que precisam se preparar para disputar uma das escassas vagas no vestibular e que o capitalismo gera uma competição desumana. O que eles não aprendem é que a escassez de vagas no vestibular é fruto da alta regulamentação estatal que pesa sobre o setor - algo muito distante do capitalismo laissez-faire. Desde jovem, portanto, os brasileiros sofrem com os males reais causados pela burocracia, enquanto são ensinados a odiar os males imaginários da alternativa que, justamente, traria o remédio para parte desses males. Por isso, terminam por se voltar para o Estado como última tábua de salvação da competição econômica, entrando em outro tipo de competição ainda mais cruel e muito menos produtiva - alimentando, portanto, um ciclo de dependência.

O ciclo contrário - e o caminho da prosperidade - passa pela construção de uma nova mentalidade; uma mentalidade que começa com o abandono da busca pela estabilidade dos cargos públicos e dos privilégios dos poderosos pelo esforço em servir o próximo da melhor maneira possível. Desse modo, iremos descobrir que um novo tipo de competição é possível: a competição por desbravar novos campos de atuação profissional e de atingir novos patamares de qualidade e produtividade. Com esse tipo de competição, todos temos algo a ganhar.

Publicado originalmente no site Ordem Livre - http://www.ordemlivre.org

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