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sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Olho com os planos que "Cano" deixou

Mídia Sem Máscara

Escrito por Eduardo Mackenzie | 17 Novembro 2011
Internacional - América Latina

Deve-se avançar para o desmantelamento definitivo das estruturas terroristas que ensangüentam o país, quaisquer que sejam, FARC, EL, BACRIM, etc. O urgente é impedir a re-organização da direção central das FARC.


O enorme triunfo político-militar que a morte de Alfonso Cano significa para o Estado e para a sociedade colombiana, não deve fazer-nos esquecer em quê contexto se deu a complexa operação Odisséia. Esta ocorreu em meio de um impressionante aumento das ações guerrilheiras das FARC. Essa ofensiva particular conseguiu propinar às forças da ordem duros golpes pontuais, sem que a inteligência militar e as Forças Armadas retrocedessem ou mudassem seus planos um só momento. O êxito da operação Odisséia deve-se a essa firmeza, mesmo em um período difícil.

O aumento das ações das FARC tinha (e continua tendo) três características principais:

1. Não é de alcance nacional. Concentra-se sobretudo em algumas zonas geográficas específicas do país (em três estados com fronteiras estrangeiras - Nariño, Arauca e Norte de Santander -, e em estados da vertente sul-Pacífico: Nariño e Cauca (sobretudo nas localidades de Corinto, Toribio, Caloto, Silvia, Cajibio, Jambaló e Suarez) e Putumayo (ataques ao oleoduto Transandino e morte de três soldados perto de Puerto Asís). Só na última semana de outubro, emboscadas guerrilheiras em vários lugares do país deixaram 23 militares mortos. No primeiro semestre de 2011, as FARC levaram a cabo 1.115 ações armadas, o que significa um aumento de 10% frente ao mesmo período de 2010. Nesse ano houve 1.947 ações armadas, uma cifra levemente inferior aos 2.063 enfrentamentos registrados em 2002, quando começou o primeiro governo de Álvaro Uribe e as FARC estavam em plena expansão. Dado colateral, mas que não é demais: Marta Sáenz, governadora de Córdoba, denunciou no final de setembro passado que 409 pessoas em seu estado haviam sido assassinadas em apenas nove meses, sobretudo pelas BACRIM.

2. O aumento da ação guerrilheira-terrorista é acompanhado de uma série de distúrbios aparentemente civis e “sociais” que o universo fariano chama de “ações de massas”. Essa combinação efetiva de “todas as formas de luta” não é nova mas havia perdido impulso durante os dois governos do presidente Álvaro Uribe. As “ações de massas” são movimentos geralmente violentos e muito estruturados, onde um setor social é utilizado simplesmente como massa de manobra e de choque. Os movimentos atuais obedecem mais a um estrito plano desestabilizador impulsionado pelas FARC e outros grupos armados, do que à espontaneidade e volatilidade de certas reivindicações sociais. As FARC tratam por esse meio, que eles abordam sob a denominação de “trabalho de massas das FARC”, de reimplantar formas de “presença” e de controle violento em zonas perdidas por eles nos últimos oito anos.

3. A intensificação da guerra jurídica-judicial está destinada a minar a moral de combate das Forças Armadas, criando a sensação difusa de que cada ato de guerra contra as FARC, e de proteção da população, por mais justificado que seja, pode se converter, meses ou anos depois, para militares e policiais, em motivo de acusação por “homicídio em pessoa protegida”, de destituição e cárcere. Também está destinada a destruir a popularidade do ex-presidente Álvaro Uribe (e de seus ex-ministros e conselheiros). Essa guerra é um componente primordial da ofensiva das FARC. Esse “trabalho” específico, confiado a equipes e escritórios especializados, faz parte central dos planos que Alfonso Cano havia traçado para tirar as FARC da fase de prostração e batida em retirada na qual a deixou a política de Segurança Democrática.

A morte de Alfonso Cano deixa automaticamente sem vigência essa configuração? Provavelmente, não. Essa morte terá, evidentemente, um impacto negativo forte, a curto e médio prazo, sobre o avanço das emboscadas. De fato, após a morte de Cano as Forças Armadas propinaram duros golpes às FARC em outros estados, sobretudo em Vichada e Meta.

As peculiares arestas da estratégia de Alfonso Cano poderiam inclusive ganhar extensão e radicalidade se o Governo continuar com sua linha de ignorar e sub-valorizar esses fenômenos, e tratá-los como algo residual e folclórico. O Estado deve reconhecer que a guerra jurídica existe e deve tomar medidas concretas, e criar dispositivos para desmascarar os atores e pô-los nas mãos da justiça. Pois essa guerra é tão ilegal e criminosa quanto a que se faz com emboscadas e minas anti-pessoas.

A artificialidade de certas lutas “sociais”, como os “protestos de camponeses” e de “indígenas” em Caloto, onde bloquearam as vias que comunicam o Valle com o Cauca nos dias anteriores ao desenlace da Operação Odisséia, é muito evidente. Entretanto, o governo parece ser míope ante o que está sucedendo nesse setor. O “trabalho de massas” das FARC está, entretanto, no auge. Está por trás de fenômenos como as “paradas armadas” que procuram intimidar a população em Arauca, nos distúrbios em algumas minas de Nariño (Mazamorras), nos incêndios e ameaças de grupos de agitadores armados, nos atentados a bala contra caminhões-tanques que transportam petróleo em Caquetá, nos distúrbios na Pacific Rubiales de Puerto Gaitán, Meta, quer dizer, em uma região petroleira-chave do país, onde está 47% da produção petroleira nacional. Ali viu-se a irrupção de provocadores e encapuzados violentos, sobretudo nos campos de Rubiales e Quifa (onde se extrai 225.000 barris diários). Métodos iguais estão sendo utilizados para levar fazendas produtoras de palma, no Magdalena Medio, à parada.

Soma-se a tudo isso o reaparecimento de milicianos vestidos de civil em numerosas localidades, sobretudo em Caquetá e Guavaire, onde a população volta a se sentir desamparada. A greve que paralisa universidades públicas e privadas, com estudantes secundaristas e até do Sena, com encapuzados, explosivos, destroços, feridos e até com um morto, faz parte da mesma onda subversiva, embora nem todos os jovens que saem às ruas sejam agitadores nem subversivos. Todavia, eles estão sendo utilizados. As FARC pretendem forjar em setores juvenis uma “vanguarda” incontrolável e melhorar seu sistema de recrutamento nas cidades.

Tudo isso põe a nu a orientação complexa que Alfonso Cano havia posto em marcha. Essa foi sua última interpretação, bastante hábil, por certo, do velho instrumento fariano da “combinação de todas as formas de luta”.

O Governo deveria oferecer uma resposta concertada e simultânea a esses três desafios, e não a só um. O restabelecimento pleno e total do foro militar deveria ser a justa resposta imediata e prática ante o ato heróico culminado no Cauca pela brilhante Operação Odisséia, na qual numerosos combatentes da Força Pública perderam a vida.

O restabelecimento do Foro Militar e o estímulo a organismos encarregados da defesa jurídica dos militares poderia ser um primeiro passo, de forte conotação simbólica, para um esforço sério de contenção da campanha psicológica contra os comandos e as bases militares pela via das falsas acusações, dos processos truncados com testemunhas e provas enfeitiçadas, com agitação internacional e com sentenças humilhantes proferidas por cortes internacionais politizadas.

A confrontação poderia se agravar se não se atacar a fundo a estratégia combinada das FARC. A via é, também, impedir as FARC de se imiscuir na luta social, a qual é, em si, legítima. As FARC e seus aparatos não têm nada que fazer nesse terreno. Deve-se avançar para o desmantelamento definitivo das estruturas terroristas que ensangüentam o país, quaisquer que sejam, FARC, EL, BACRIM, etc. O urgente é impedir a re-organização da direção central das FARC. Que relevância pode ter nesse contexto, saber quem substituirá Cano na chefatura das FARC? Que diferença há entre um Iván Márquez e um Timochenko? O importante está em outra parte. Está em saber como quebrar os planos deixados por Cano, em incrementar a deserção e ampliar a desordem entre cada componente das FARC, em cortar o fluxo de narco-dólares, armas e explosivos dentro dessas estruturas, em frustrar os golpes vingativos que algumas comissões e frentes estão preparando contra as Forças Armadas, contra a classe política e contra a sociedade, e relançar a cooperação entre os cidadãos e as Forças da ordem.



Tradução: Graça Salgueiro

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