EUA e o programa nuclear brasileiro
Sexta-feira, Janeiro 09, 2009
Resistência militar
EUA cobram que Brasil aceite maior fiscalização de seu programa nuclear
Plano de Defesa, lançado em dezembro, diz que país não vai aderir a protocolo
IGOR GIELOW
SECRETÁRIO DE REDAÇÃO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Os Estados Unidos cobraram ontem a adesão do Brasil ao chamado Protocolo Adicional do TNP (Tratado de Não-Proliferação Nuclear), um dia depois de finalmente aceitarem o mecanismo que permite uma fiscalização mais precisa dos programas atômicos dos países signatários do acordo.
"Levou tempo para acertarmos os arranjos técnicos para sua implementação. Mas nós respondemos às questões, fizemos os acertos e agora estamos prontos para começar a implementá-lo. Esperamos que o Brasil faça o mesmo", disse à Folha Gregory Schulte, embaixador americano na AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica).
Em dezembro, o governo Lula lançou sua Estratégia Nacional de Defesa, na qual a energia nuclear é tratada com destaque. O texto, ambíguo, lamenta restrição ao acesso a tecnologias e permite interpretação de que no futuro o Brasil pode lançar mão de outros usos da energia nuclear - leia-se a bomba.
E é claro sobre sua posição em relação às potências atômicas, capitaneadas pelos EUA. "O Brasil zelará por manter abertas as vias de acesso ao desenvolvimento de suas tecnologias de energia nuclear. Não aderirá a acréscimos ao Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares sem que as potências nucleares tenham avançado na premissa central do tratado: seu próprio desarmamento", diz o texto.
Os "acréscimos" em questão são justamente o Protocolo Adicional, que é assinado separadamente por cada país signatário do TNP e permite maior abertura de seus programas nucleares aos técnicos da AIEA, baseada em Viena.
Ele foi criado após a descoberta do programa nuclear paralelo de Saddam Hussein após a primeira Guerra do Golfo, em 1991. Hoje são 118 os signatários, e 89 já o implementaram. Há 189 aderentes ao TNP.
As palavras do embaixador Schulte, que foi informado sobre o texto da Estratégia Nacional de Defesa pela reportagem, mas não o comentou, devolvem a bola ao campo brasileiro.
Procurado pela Folha, o Itamaraty não comentou o caso imediatamente. É a praxe: sua missão em Viena tem de recolher dados e analisá-los antes de um posicionamento ser tomado. O Ministério da Defesa vai aguardar essa análise para se pronunciar ou não.
Mas a posição brasileira é conhecida, tendo apenas sido explicitada em termos não muito diplomáticos no documento da Defesa. Desde os anos 70, quando buscou tecnologia alemã para reatores nucleares, o Brasil procura sua independência no campo. Só renunciou à bomba com o fim da ditadura.
O TNP foi assinado pelo Brasil em 1998, e não são poucas as pessoas nos meios militares e diplomáticos que consideram a adesão uma capitulação a um tratado que foi desenhado para subordinar quem não tem a bomba atômica aos desígnios dos que a tem.
Com efeito, os EUA demoraram anos para aderir ao Protocolo Adicional. "A adoção levantou questões políticas nos EUA, assim como no Brasil", afirmou Schulte. "Ele é um instrumento de verificação, mas também serve como medida de estabelecimento de confiança", disse ele, para quem uma adesão brasileira iria "ajudar a criar um padrão mais alto para o resto do mundo".
Na diplomacia brasileira, tais palavras tendem a ser lidas como uma tentativa de tutela, embora o relacionamento entre os países na AIEA seja bom.
Fonte: Folha de S. Paulo - 9/1/2009
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