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quarta-feira, 11 de agosto de 2010

O Bico doce de FHC

Mídia Sem Máscara

Ferdinand Lassalle, o precursor da social-democracia alemã, era amigo íntimo e emprestava (sem retorno) dinheiro à Marx, o pai do "socialismo científico", e o próprio Lenin, por sua vez, diante do fracasso econômico dos primórdios da revolução socialista russa, passou marcha à ré e transou numa boa com o mercado - para depois abatê-lo a pauladas.

Fernando Henrique Cardoso volta a atacar, desta feita com um livro intitulado "Xadrez internacional e social-democracia" (Editora Paz e Terra, 2010, Rio), uma coletânea de textos requentados (daí, o preço "irrisório": R$ 29,00) sobre as transformações econômicas e políticas do mundo atual, em especial da América Latina e do Brasil.

O trololó de FHC tem fôlego curto e, como sempre, fica no terreno da típica "embromation" uspiana: em síntese, para ele, desenvolvimento econômico e social são fenômenos circunscritos às relações de poder. E como o Bico Doce enxerga o mundo feito um tabuleiro de xadrez, no qual se joga a estratégia (macabra) dos partidos políticos (de esquerda) para manter o poder, o que importa na sua visão de "intelectual orgânico" é como se tramar novas regras à frente do governo para melhor tungar, com maior ou menor dose de esperteza, a patuléia ignara.

FHC marcou ponto no mundo acadêmico esquerdista ao laborar a malsinada "Teoria da Dependência", segundo a qual os países subdesenvolvidos deveriam se associar entre si para atingir o ponto ótimo da riqueza - uma sandice sem limites, pois, conforme comprovam os fatos, miséria só gera miséria.

(Enquanto sociólogo da USP, Fernando Henrique Cardoso et caterva mantiveram a pretensão de contestar Gilberto Freyre, que, no clássico "Casa Grande & Senzala", obra fundamental para a vida inteligente do país, assinalou o valor e a supremacia da mestiçagem na formação histórica da sociedade brasileira; FHC, dentro dos padrões estabelecidos pelo receituário marxista, condenava, em tal teoria, o patriarcalismo brasileiro como de natureza discriminatória, uma evidente impostura, visto que o próprio FHC, nascido com o "pé na cozinha" - frase dele - chegou à presidência da República por força da permeabilidade social preconizada pelo Mestre de Apipucos).

Há muito que contar sobre FHC, herdeiro da derrocada de Collor de Mello, contra quem tramou tanto - ou mais - do que o sindicalista Lula da Silva. Mas o fato concreto é que o nosso eterno Bico Doce, uma vez à frente da ambicionada presidência, falhou miseravelmente: com ele no Planalto, entre outros tantos malefícios, tivemos a ascensão criminosa do MST e o escândalo do Proer (no qual banqueiros fraudulentos saíram sãos e salvos), para não falar na extravagante ampliação da máquina burocrática de Brasília, na irresponsável crise do apagão, na expansão galopante de juros e impostos e na compra de votos para aprovação da própria reeleição - fonte inspiradora, quando do primeiro mandato de Lula, do tristemente célebre "mensalão".

(No momento, por força da sua atuação na endinheirada "Inter-American Dialogue", FHC lança suas "luzes" de intelectual engajado na refrega pela "descriminalização da maconha", como todos sabem, um dos agentes tóxicos apontados como responsável pelo altíssimo índice de criminalidade que abate milhões de brasileiros, sem distinção de cor, sexo ou condição social).

Em tempo de eleições presidenciais, por conta do lançamento do seu livro, FHC toca o seu realejo de analista caga-regras. Nas páginas róseas de "O Globo" (01/08/2010) ele diz o seguinte, reportando-se ao papel da social-democracia no xadrez internacional:

- "O bem-estar do continente e do mundo em parte se deve às políticas social-democratas, que acabaram sendo absorvidas como políticas de Estado. Não é tanto o Estado produtor, mas o socialmente provedor, que ainda tem um efeito enorme em toda a Europa Ocidental".

Aqui o Lassalle caboclo pisa feio na bola. Mas vamos por partes, como faria Jack, o Estripador: em primeiro lugar, é necessário repetir que o mundo, no qual habitam hoje quase sete bilhões de pessoas, ao contrário do que afirma FHC, vem enfrentando duras e sucessivas crises, algumas delas de proporções inabordáveis, tais como, por exemplo, as que atingem boa parte da Europa, em especial Alemanha, França, Itália, Grécia, Portugal e a própria Escandinávia, tida e havida como o "paraíso" da social-democracia.

Em segundo lugar, é preciso enfatizar que o modelo social-democrata, com seus governos perdulários, tem sido o principal responsável pela crise européia, vítima do insolvente Estado provedor, mantido artificialmente por uma burocracia corporativa que se apropria sem o menor pudor da riqueza gerada pela população economicamente ativa. (A crise permanente do Euro, neste particular, denuncia a sintomatologia do mal).

Quanto aos percalços da estratégia social-democrata para a América Latina, atropelada por governos de "tendências autoritárias", tais como os da Venezuela, da Bolívia e do Equador, o sociólogo pontifica:

- "Com o tempo, o PT e Lula evoluíram. Hoje, eles são social-democratas à moda latino-americana. Todos nós (PSDB e PT) somos, e a diferença ideológica é pequena e simbólica. O que ocorre na Venezuela e na Argentina são escorregões democráticos fenomenais. Mais isso eu não chamo social-democracia, porque a social-democracia aceitou o mercado com limite, a democracia como valor e a necessidade imperativa de políticas sociais para melhorar a qualidade de vida da população".

Aqui é preciso fazer algumas digressões: tal como se estabeleceu no mundo político, a social-democracia é um conceito anômalo. Ela é antagônica ao socialismo revolucionário apenas como atuação estratégica, mas tanto uma quanto o outro buscam os mesmos fins, ou seja: a eliminação da democracia liberal, do capitalismo e da propriedade privada para se chegar à sociedade comunista - a chamada "utopia selvagem".

Para tornar a coisa mais clara, a social-democracia tem como objetivo o socialismo (e o comunismo, numa etapa posterior) mediante a eliminação da "democracia burguesa", através de uma progressiva ação fiscalista (pagamento de impostos) para estabelecer, gradativamente, o sonhado igualitarismo.

Mas para os desavisados é bom não esquecer que Ferdinand Lassalle, o precursor da social-democracia alemã, era amigo íntimo e emprestava (sem retorno) dinheiro à Marx, o pai do "socialismo científico", e que o próprio Lenin, por sua vez, diante do fracasso econômico dos primórdios da revolução socialista russa, passou marcha à ré e transou numa boa com o mercado - para depois abatê-lo a pauladas.

Reside, assim, nesta contradição, de uma só vez, o fracasso da social democracia e do socialismo revolucionário. Para sobreviverem no seu mundo de promessas e engodos e não matarem a galinha dos ovos de ouro, os esquerdistas são obrigados a conviver com a "democracia capitalista", único sistema capaz de levar em conta, ao mesmo tempo, os interesses das massas operárias e o das distintas classes médias, possibilitando liberdade com desenvolvimento econômico - o que significa dizer, na prática, a almejada inclusão social.

É claro que FHC não explica essa contradição do mundo socialista aos principais interessados, ou seja: à patuléia ignara. O trinar do seu bico doce fica adstrito ao canto de um futuro próspero e venturoso, que ele, muito sabidamente, usufrui no presente glorioso e feliz.

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