Raposa: "Só haverá violência se houver violência"
Sábado, 2 de Maio de 2009
Movimento da Ordem e Vigília Contra Corrupção
Saída forçada de não-índios começa hoje; desembargador diz não esperar resistência - Roldão Arruda – O Estadão
Choro de não-índios, tensões entre índios e manifestações de protesto marcaram ontem o prazo final dado pelo STF para a saída de não-índios da Terra Indígena Raposa Serra do Sol.
Hoje começa a retirada forçada das famílias que continuam na área - um espaço de 1,7 milhão de hectares, que passa para o controle de cerca de 19 mil índios, de cinco diferentes etnias. É fase final da Operação Upatakon 3, que mobiliza cerca de 400 agentes da Força da Segurança Nacional e da Polícia Federal.
Ontem,
O dia do desembargador foi agitado. Pela manhã, recebeu a informação de um aumento das tensões na Vila Surumu, ponto de acesso à terra indígena. Grupos ligados ao Conselho Indigenista Missionário (CIR) estariam forçando a saída de famílias em que se misturam índios e não-índios (e que têm o direito legal de permanecer na área).
Em reunião com organizações envolvidas na operação de retirada, o desembargador constatou que os locais para onde as famílias estão sendo levadas não oferecem condições de moradia. Por isso, chegou-se a cogitar a possibilidade de uma dilatação no prazo de saída.
A reportagem do Estado visitou um desses locais, a Cidade Satélite, na periferia de Boa Vista. As casas doadas pela prefeitura ficam no meio de conjunto habitacional ainda não inaugurado, sem moradores. Faltam água, luz, rede de esgoto, ruas, meio-fio, árvores. Para as famílias que preferiram ser transferidas para a zona rural, as condições não são melhores.
Na reunião, o desembargador recebeu a promessa de que as instalações
Um dos produtores rurais que continuam na reserva é Vanda Batista de Souza, de 53 anos. Ao lado da irmã e do cunhado, ela cria 150 cabeças de gado no Igarapé Azul, nas proximidades da Vila Fria. Ela foi à Funai para explicar, chorando, que não pretende ir para área designada. "Me ofereceram uma terra para a qual eu não gostaria de ir nem para ser enterrada", disse. "É tão ruim que está vazia há muito tempo porque ninguém nunca quis ir para lá."
FRASES
Vanda Batista de Souza - Produtora rural
"Me ofereceram uma terra para a qual eu não gostaria de ir nem para ser enterrada"
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Enquanto isso:
ÍNDIOS RIVAIS JÁ DISCUTEM “HERANÇA” NA RAPOSA
Disputa por construções abandonadas por arrozeiros na reserva acirra as divergências entre grupos de indígenas em RR.
No último dia do prazo legal para a saída dos não índios da reserva Raposa/Serra do Sol, indígenas de entidades rivais já discutiam ontem a "herança" de quem deixou a área.
Construções abandonadas na vila Surumu (porta de entrada da terra indígena) estão sendo ocupadas por índios da Sodiur (Sociedade de Defesa dos Índios Unidos do Norte de Roraima), que apoiou a permanência dos arrozeiros.
O problema é que, para lideranças do CIR (Conselho Indígena de Roraima), organização a favor da saída dos não índios, as chaves dos imóveis deveriam ser dadas à Funai (Fundação Nacional do Índio), que depois decidiria o que fazer com eles.
"Estamos fazendo isso porque eles [CIR] querem abarcar tudo", disse o índio macuxi Edinilson Albuquerque, da Sodiur.
Cristóvão Galvão, um dos líderes do CIR na região, disse que fará apenas o que mandar a Justiça. Para ele, "esse discurso de derramamento de sangue" é exclusivo dos que foram derrotados pela decisão do STF, de manter a demarcação contínua da reserva, que ocupa 7% do Estado (1,7 milhão de hectares). Ambos disseram que as diferenças entre as entidades devem aumentar após a retirada completa dos não índios.
TERRA ARRAZADA
Outra disputa deve envolver a ocupação das ao menos oito fazendas de arroz, propícias para plantações e criação de animais. Nas propriedades, não restou muito para ser usado. Os arrozeiros as tornaram "terra arrasada" antes de sair.
Paulo César Quartiero, líder dos produtores, tirou quase tudo de sua fazenda. Depois, usou máquinas para derrubar até as construções de alvenaria. Ontem, o tráfego de caminhões que saíam das propriedades era intenso. Tentavam levar tudo o que podiam até a 0h de hoje, quando vencia o prazo para a saída voluntária.
Os poucos expulsos que ainda restavam na vila ontem esperavam os caminhões cedidos pelo governo estadual para levar os bens. Segundo afirmaram, eles somavam menos de dez famílias. As que não conseguirem sair no prazo não devem resistir à retirada. Mas há outras no interior da reserva, que podem insistir em ficar.
Já os índios não demonstravam estar na reta final de um conflito que, dizem eles, durou 38 anos e lhes custou 22 vidas. Na escola e nas casas, não havia sinais de festa.
A tranquilidade na vila só foi quebrada pela chegada do presidente do TRF (Tribunal Regional Federal) da 1ª Região, Jirair Meguerian, e de um ônibus com 50 agentes da FNS (Força Nacional de Segurança). A FNS, junto à Polícia Federal e à Funai, começaria a operação de retirada de quem insistir em ficar na área a partir da madrugada de hoje. A ação pode durar até um mês e será realizada por mais de 500 funcionários federais.
Meguerian pediu aos índios que não tentem expulsar aqueles que não saírem após o final do prazo. A ordem é para que apenas a PF faça isso. João Carlos Magalhães – Folha de São Paulo
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